A (R)Evolução do Acesso
Digital Rural - Dênio Mágno da Cunha *
19 de
novembro é uma data comemorativa no Brasil. É o dia da
bandeira. Símbolo de nossa nacionalidade e da esperança
de um país grande, expressivo. Bandeiras são isto mesmo,
símbolos utilizados pelos povos para expressarem a sua altivez,
seu poder, suas origens e suas características.
Neste dia, no ano da graça de 2003, uma bandeira virtual
começou a tremular no espaço cibernético mundial
com a instalação do primeiro Telecentro Rural Brasileiro,
na comunidade de São Gonçalo do Rio das Pedras, Vale do
Jequitinhonha.
A partir daquela data a pequena comunidade rural do interior do Brasil
ingressou no mundo digital. A partir de agora, aquela pequena
comunidade poderá viver em sintonia com o que acontece no mundo,
atualizar seus conhecimentos, treinar seus jovens, preparar suas
crianças, apoiar seus empreendedores, ter acesso às
tecnologias agrícolas mais avançadas, comunicar-se com o
poder público, conhecer os planos de desenvolvimento perpetrados
por seus representantes legislativos, comunicar-se com seu entes
distantes, preservar sua cultura digitalmente e ter
condições de sair da marginalidade a que estava confinada
no processo de desenvolvimento cultural do país.
Se a Carta de Pero Vaz de Caminha incluiu a então terra de Santa
Cruz no mundo da navegação de então, o primeiro
e-mail enviado a partir do telecentro de São Gonçalo,
inclui o Brasil rural na malha do conhecimento mundial. Aos olhos de um
habitante urbano o gesto de enviar um e-mail pode parecer pequeno, mas
na verdade significa muito mais, dadas as possibilidades de
desenvolvimento que se abre aos moradores daquela comunidade.
Inclusão
Digital
A
partir do início da Era da Informação
começamos a ter no mundo uma divisão social que têm
evoluído de forma exponencial, com características
totalmente diferentes das exclusões econômica e social que
são marcas da Era Industrial. Se na Era Industrial era
permitido ao indivíduo permanecer à margem de sua
evolução, através de formas alternativas de vida,
na Era da Informação isto não é
possível. Não existe alternativa à falta de acesso
a informação.
Enquanto milhões de pessoas ao terem acesso a
informação, evoluem em seus relacionamento e
conhecimentos, outros tantos milhões, prosseguem paradas no
tempo e ficando cada vez mais distante do acesso ao desenvolvimento,
à discussão de idéias e distantes do novo mundo da
comunicação que se configura em nosso país.
É dentro desta realidade que surgiu a ONG GEMAS DA TERRA, REDE
RURAL DE TELECENTROS COMUNITÁRIOS, com o objetivo de facilitar a
criação de telecentros livres nas comunidades rurais
brasileiras através da promoção da
integração aos movimentos globais de inclusão
digital, do qual o Telecentro de São Gonçalo do Rio das
Pedras, faz parte.
O Projeto
Piloto e a Disseminação de Conhecimento
O
Brasil tem dimensões continentais, o que dificulta em muito a
tarefa de integrar seu povo à rede mundial de
informação e eliminar a exclusão digital. No meio
urbano este processo já tem experiências em
desenvolvimento, algumas com extremo sucesso nas comunidades onde foram
implantadas. Mas o meio rural brasileiro, por suas dificuldades de
acesso, continuava, como sempre, sendo relevado a um segundo plano
neste processo de inclusão. Era necessário demonstrar ao
mundo a possibilidade de atuar também no meio rural, pelo
desenvolvendo de ferramentas e tecnologias próprias, adequadas
à sua realidade cultural, contra a exclusão digital. Se
isto não viesse a acontecer, teríamos a
perpetuação do modelo urbano-desenvolvido versus
rural-defasado, que tem marcado o nosso processo de desenvolvimento
econômico/social.
Em parceria com a UNESCO, Ministério das
Comunicações, Prodabel, Funivale, ONG Comunidades
Catalisadoras, associações comunitárias e
voluntários, preocupados com esta cruel divisão, foram
definidas pela GEMAS DA TERRA, cinco comunidades para serem sedes do
projeto piloto de Telecentros Rurais. São Gonçado do Rio
das Pedras, Tombadouro, Milho Verde, Rodeador e Conselheiro Mata, todos
localizados na região da Serra do Espinhaço, Alto do
Jequitinhonha, uma das regiões mais pobres de nosso país,
foram as escolhidas.
O projeto piloto é por sua própria natureza, uma
ação aberta, que possibilita a replicação
de seu modelo por todos aqueles que tenham como objetivo promover a
inclusão digital. Todas as informações sobre sua
evolução, como também, conhecimentos gerados a
partir da preparação até a
implantação estão disponíveis em
sítio próprio:
http://www.gemasdaterra.org.br
Através desta disponibilidade de conhecimento, a ONG GEMAS DA
TERRA, considera que é possível incentivar outras
ações de idêntico propósito e reduzir o
tempo que levaríamos para promover a inclusão das
comunidades rurais brasileiras à Era do Conhecimento.
A partir de agora o projeto piloto pode ser acompanhado e sua
experiência pode ser replicada, debatida, aprimorada por toda a
rede de pessoas e organizações envolvidas na luta contra
a exclusão digital.
Mas não é só para as comunidades rurais que este
projeto trará desenvolvimento. Para a comunidade
científica e tecnológica também, uma vez que todo
o instrumental tecnológico utilizado nos telecentros do projeto
piloto serão desenvolvidos dentro da filosofia do software
livre, ou seja, todo o conteúdo gerado na Rede Gemas da Terra
será livre, incluindo os cursos de capacitação e
as metodologias de implantação de telecentros.
Por isto tudo e pelas potencialidades que a instalação
dos Telecentros Rurais abre é que esta data ganha
relevância no cenário do desenvolvimento e da
construção de uma nova realidade social e econômica
para nosso país. 19 de novembro de 2003 marca o início da
revolução digital para as comunidades rurais brasileiras.
Dênio Mágno é Diretor de Programas da ONG Gemas da
Terra
Contato: denio@gemasdaterra.org.br
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